UEL aprova diplomação póstuma de Júlia Garbossi vítima de feminicídio
Jovem tinha apenas 23 anos quando foi assassinada ao tentar defender amigos durante ataque feminicida em Londrina.

O Conselho Universitário da Universidade Estadual de Londrina (UEL) aprovou a diplomação póstuma da estudante Júlia Beatriz Garbossi. A jovem cursava o quinto semestre de Ciências Sociais quando foi brutalmente assassinada pelo stalker de sua colega de casa. O diploma foi aprovado na última semana, quando completaram dois anos do atentado feminicida a três estudantes deixando duas vítimas fatais.
O jovem Daniel Takashi Suzuki Sugahara também teve a vida ceifada pelo feminicida (relembre o caso).
O pedido de diplomação póstuma de Júlia foi feito pelo Observatório de Feminicídios de Londrina (Néias) e o Laboratório de Estudos de Feminicídios (Lesfem). No entendimento das organizações, alinhadas a classificações de organismos internacionais, Júlia foi vítima de feminicídio por conexão.
A jovem tinha apenas 23 anos e foi morta ao tentar defender os amigos durante o ataque.
“Júlia, embora não fosse o alvo do feminicida, foi esfaqueada por ele ao tentar socorrer sua colega de casa. A morte de uma mulher presente no local de um ato feminicida perpetrado contra outra mulher é caracterizada por alguns organismos internacionais como ‘Feminicídio por conexão’, classificação que, embora não adotada pelo Ministério Público local, vem sendo defendida por ativistas e pesquisadoras”, explicam as organizações.
Tanto Néias quanto Lesfem atuam na produção de ações de enfrentamento à violência feminicida em Londrina e região e têm, dentre seus objetivos, a busca por restituição de direitos das vítimas e seus familiares, assim como garantir que a memória das vítimas de feminicídio seja honrada.
“Com a diplomação póstuma buscamos não apenas lembrar que a ausência de Júlia é profundamente sentida nessa instituição, mas também que alguns de seus sonhos e lutas, que emergiram durante a realização do curso, não sejam esquecidos. Também consideramos esse ato como um gesto de acolhimento de seus pais, que acompanharam a dedicação de Júlia à universidade”, pontua Martha Ramirez-Gálvez, presidenta de Néias.
“Ante toda a tristeza dos fatos”, destaca a antropóloga, também docente da UEL, “a diplomação póstuma deixará posto que sua vida ceifada aos 23 anos nos impulsiona no caminho da mudança social que buscamos, para que todas as meninas e mulheres estejam seguras, mudança na qual a universidade tem papel importante”.
Direito e reparação
Fundadora do Néias e coordenadora do Lesfem, Silvana Mariano, docente da UEL, defendeu a diplomação durante a sessão do Conselho Universitário. Para ela, a busca por reparação representa uma forma de “Pensar a justiça para além do Judiciário. Pensar como cada uma das instituições tem o dever de promover o que é justo, promover uma vida justa, que é também livre de violência e livre do medo.”
Silvana destacou como as mulheres convivem com o medo, inclusive dentro das próprias casas.
“Júlia estava dentro de sua casa. Ela nem era o alvo de seu algoz; foi uma vítima indireta do feminicídio. Ela vivia com uma colega que ousou desafiar essa sociedade patriarcal e dizer ‘não’ aos interesses e desejos sexuais e amorosos do feminicida. Ele invadiu a casa e matou quem estava na frente, Júlia e Daniel”, pontua.
Para a docente, medidas como a diplomação póstuma são formas de pensar na promoção da justiça pela perspectiva do direito à memória, do direito à verdade. “Isso passa por nomear esse crime como feminicídio e reconhecer e dar lugar na nossa memória coletiva a essas vítimas. Quando criamos memória coletiva transformamos perdas individuais em consciência social. Esta é a nossa possível contribuição contra a naturalização desse poder masculino que ainda nos atravessa”, finaliza.
Outras homenageadas:
Para Néias, a aprovação da diplomação póstuma de Júlia Garbossi é uma forma de honrar, também, a memória de outras mulheres integrantes da comunidade universitária da UEL vitimadas pelo feminicídio:
Andreia de Jesus Cabral: 21 anos, estudante de Serviço Social, assassinada com sua namorada, Rúbia Graziele de Almeida, 19 anos, em 2004.
Tathiana Name Colado Simões: 35 anos, mãe de um filho de 3 anos, estudante de pós-graduação, assassinada em 2012.
Lua Padovani: artista, estudante de Artes Visuais, desaparecida e encontrada cerca de 30 dias após seu provável assassinato, em 2017.
Sandra Mara Curti: 43 anos, funcionária da Clínica Odontológica da UEL, mãe de dois filhos, de 8 e 12 anos, assassinada pelo ex-companheiro em 2020.
Redação Tem Londrina com Néias